A palavra indiana dalit significa quebrado, esmagado, oprimido. Para os indianos pertencentes às castas, os dalits representam a poeira nos pés de Deus. São os párias, os proscritos, cuja vida é regida por um sistema de apartheid. Até o esbarrar em suas sombras pode poluir o corpo e a alma dos homens de casta. Os dalits não podem orar nos templos, e nas escolas não lhes é dado o direito de entrar em sala de aula; se entram, só podem se sentar nas últimas fileiras. A voz deles quase nunca é ouvida. Por isso os dalits são quase sempre analfabetos e a taxa de mortalidade infantil entre eles chega a 10%. São os últimos no ranking social e sequer são considerados como parte do sistema.
Esta realidade mostrada na novela "Caminho das Índias", da TV Globo é um claro exemplo de discriminação. Talvez nos espante o tratamento dado aos dalits, mas nos esquecemos de olhar os dalits do nosso cotidiano. Esquecemos que, muitas vezes, também somos acometidos de uma cegueira preconceituosa causada pela nossa prepotência.
O psicólogo Fernando B. Costa é autor de uma tese de mestrado muito reveladora sobre a invisibilidade social. Ele vestiu um uniforme de gari e por oito anos varreu um campus universitário, para observar o tratamento dispensado aos profissionais que exerciam trabalho braçal mal remunerado naquele local. Essas pessoas pareciam invisíveis, eram os nossos dalits,aqueles que varriam as ruas, recolhiam os tocos de cigarro, as fezes dos cachorros, enfim, faziam o trabalho considerado sujo e não apropriado para quem tem acesso à informação, faz faculdade, conquista um emprego e tem chance de ascender na escala social. Os invisíveis jamais recebiam um bom-dia, um sorriso, um olhar, uma conversa amistosa… O autor da tese concluiu que, naquele ambiente, as funções sociais eram mais valorizadas do que os indivíduos.
Quem tratamos como dalits no nosso dia a dia?
Comece a prestar atenção nas ruas e perceba a reação de algumas pessoas se um mendigo se aproxima ou se uma criança pede um lanche. A maioria finge que não vê, muda de calçada, alguns até soltam palavras de ódio contra quem ousa lhes dirigir a palavra.
Nas empresas acontece o mesmo. Vamos repensar como estão as nossas relações interpessoais? Como exercemos o poder? Como pedimos aos boys para fazer suas tarefas? Cobramos sem ensinar? Como tratamos a moça do café, a que limpa os banheiros, o funcionário novato que não conhece as regras da empresa?
Nós não transformamos em dalits somente os que exercem as funções mais humildes, mas também nossos pares. Quem escolhemos para ser nosso saco de pancadas, a quem estendemos o dedo acusador só por crueldade?
Ninguém é permanentemente generoso. Nós também somos sádicos e perversos, bichos raivosos prontos para atacar, principalmente quem não pode, por mero instinto de sobrevivência, se defender…
Para refletir: será que é possível fazer uma autoanálise consciente para ter mais respeito, empatia, compaixão?
Não se engane: cada um de nós também é um dalit para alguém, quando:
a) Um novo profissional exerce o mesmo cargo que o seu e entra na empresa ganhando o dobro do seu salário;
b) O Diretor não o convida para o fim de semana na casa de praia, mas convida todo o resto do seu grupo;
c) Aquele trainee trata você com arrogância e nem quer saber o que você pode lhe ensinar;
d) Na reunião, o cliente só olha para os outros sócios e não presta atenção no que você diz;
e) Você se sente um estranho no ninho em um determinado ambiente;
f) Em uma roda social, você percebe que alguém faz uma ironia ou ignora a sua presença;
g) Você é discriminado pela sua cor, posição social ou postura política.
Ninguém quer ser invisível nem quer ser ignorado. A indiferença é para muitos uma espécie de morte moral.
A sobrevivência saudável também precisa de atenção, elogios, reconhecimento e respeito.
Por Lena Almeida e Eunice Mendes (consultoras sênior do Instituto MVC, autoras do livro Falar bem é fácil e do programa e-learning Técnicas de Apresentação. Website: http://www.institutomvc.com.br/)
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quinta-feira, 13 de agosto de 2009
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